quinta-feira, julho 03, 2008

Biblioteca feminista básica

Na semana passada decorreu em Lisboa o terceiro Congresso Feminista português. Sendo que o primeiro foi em 1924 e o segundo em 1928. Há 80 anos portanto. Que este evento tenha passado quase completamente despercebido na imprensa nacional não surpreende. Parece que o feminismo ainda é uma palavra feia, com associações pejorativas, fruto de uma enorme ignorância sobre o tema. É incrível que numa época em que colhemos os benefícios da luta de inúmeras mulheres que desafiaram instituições, família e sociedade, para fazer valer os direitos de todos os seres humanos, não o saibamos reconhecer.
Para desmistificar e informar, aqui vão algumas sugestões para uma biblioteca básica do feminismo.


Introduções curtas



Feminism: a short introduction - Margaret Walters (Oxford University Press)

Estes livrinhos pequeninos costumam fornecer uma introdução breve e imparcial sobre os temas. Infelizmente é quase impossível encontrá-los em Portugal, o melhor é encomendar pela net.


Feminism - June Hannam (Longman)

Este pelo contrário, encontra-se à venda pelo menos na Livraria Leitura. É uma boa introdução histórica, referindo-se às 3 "vagas" mais importantes do feminismo (a do movimento sufragista, a dos anos 70 e a actual).

Tenho pena de não apresentar uma boa introdução ao feminismo em português, mas infelizmente não me lembro de nenhuma. Há um livrinho pequenino de uma francesa, Isabelle Alonso, chamado "Todos os homens são iguais... mesmo as mulheres" que introduz alguns dos temas importantes do feminismo, mas não sei se é uma boa introdução.


Livros essenciais

A Room of One's Own - Virginia Woolf

Já traduzido para português, mas vale a pena ler o original (como todos os livros da Virginia Woolf). Ideia geral: uma mulher, para escrever, precisa no mínimo de ter um quarto para si própria (privacidade) e dinheiro para comprar tinta e papel. No tempo de Woolf muito poucas mulheres podiam dispôr destes meios, ou de tempo para se dedicarem aos seus próprios interesses; nesse aspecto ela era uma privilegiada.


A Sujeição das Mulheres - John Stuart Mill (Almedina)

Brilhante defesa dos direitos das mulheres numa época em que o casamento pouco melhor era para a mulher do que uma escravatura sob outro nome. Stuart Mill argumenta que a sociedade teria imenso a ganhar se metade das pessoas não fosse impedida, à partida, de dar o seu contributo intelectual, político e social. Advoga o direito de voto para as mulheres, a possibilidade destas serem admitidas em carreiras profissionais que na altura lhes estavam vedadas, como a medicina e a advocacia, e alterações na lei do casamento que permitissem por exemplo, que uma mulher casada pudesse dispôr dos seus próprios bens.

Não resisto a aproveitar a oportunidade para recomendar também "Sobre a Liberdade", outro livro importantíssimo do mesmo autor.


O Mito da Beleza - Naomi Wolf (não me lembro qual é a editora portuguesa, mas sei que está traduzido)

Como os padrões de beleza são usados para controlar e desvalorizar as mulheres. Apesar de tudo o que as mulheres conseguiram até hoje (pelo menos na sociedade ocidental), mensagens constantes dos media e da publicidade tentam, desde cedo, incutir-nos a ideia de que os nossos corpos são imperfeitos, e que só comprando este ou aquele produto poderemos sentir-nos bem connosco próprias. Esta insegurança é a base de uma gigantesca indústria de produtos de beleza e emagrecimento.

Indústria essa que aliás, está a começar a explorar também o mercado masculino. Era bom que todos nós tomássemos consciência de um simples facto do marketing: uma pessoa satisfeita consigo própria não dá um grande consumidor. A publicidade visa especificamente criar inseguranças e necessidades onde elas antes não existiam.


Backlash - Susan Faludi (penso que está traduzido para português do Brasil)

O backlash, ou ricochete, é a resposta conservadora ao feminismo. Significa que sempre que são feitos alguns avanços, a direita mais conservadora tenta recuperar terreno e anular algumas dessas conquistas. Susan Faludi reporta-se aos anos 80, mas actualmente também acontecem situações semelhantes. nunca podemos achar que os nossos direitos conquistados estão seguros; pelo contrário, devemos manter-nos sempre alerta contra aqueles que nos querem retirar as nossas liberdades. Isto vale para os direitos das mulheres como vale para a democracia, a liberdade de imprensa, e muitos outros direitos arduamente conquistados.


O Segundo Sexo - Simone de Beauvoir (Quetzal)

Eu sei que este é um dos livros mais marcantes do movimento feminista; no entanto confesso que ainda não o li, porque me custa um bocado ler em francês. Está esgotado há imenso tempo em Portugal, mas acabou de ser agora reeditado o primeiro volume e o segundo sairá ainda este ano, creio eu. Fiquei com a impressão de que a ideia geral é que a mulher é mais um ser construído do que natural (o que não é totalmente correcto do ponto de vista científico, mas é um bom ponto de partida para nos apercebermos de como a sociedade molda as pessoas segundo ideias pré-concebidas).


Livros sobre as mulheres


História das Mulheres no Ocidente, 5 volumes - dir. Georges Duby e Michelle Perrot (Afrontamento)

Não é um livro feminista, mas é uma conquista do feminismo que actualmente se escrevam livros sobre a História das mulheres, geralmente relegadas para segundo plano na História tradicional que se escrevia até ao séc. XX.

Para ser sincera só li o primeiro volume, sobre a Antiguidade, que é a época que acho mais interessante, mas suponho que os restantes volumes sejam de igual qualidade.


Mulher: Uma Geografia Íntima - Natalie Angier (Gradiva)

Uma viagem ao corpo da mulher. Do ponto de vista da biologia, é interessantíssimo. Mas não fala só sobre cromossomas e hormonas; fala também sobre questões mais relevantes para as nossas vidas, por exemplo porque é que todas as mulheres deveriam praticar exercício físico, incluindo musculação, em qualquer idade.

Estou morta que a Gradiva publique o último livro dela, The Canon: The beautiful basics of science, que me parece ser uma boa introdução à ciência para quem venha de outras áreas.


Women, Art, and Society - Whitney Chadwick

Uma História da arte no feminino. A Paula Rego também aparece.






Feminismo islâmico

Uma Mulher Rebelde - Ayaan Hirsi Ali (Presença)
(Infidel, no original)

Muito impressionante. Uma mulher que sofreu na pele a mutilação genital, um casamento forçado, conseguiu pedir asilo na Holanda, e actualmente é

perseguida por fundamentalistas islâmicos pelas suas ideias feministas e contra a opressão da religião e dos costumes tradicionalistas. Vale a pena conhecer a história de coragem desta mulher.


Persépolis - Marjane Satrapi (Jonathan Cape, London)

O filme é bom, o livro é uma delícia. Autobiografia em banda desenhada que retrata com humor a vida quotidiana sob a opressiva teocracia do Irão.








Esta é apenas uma pequena lista, muito pessoal. Mas é um ponto de partida para explorar, afinal, o que é que "estas gajas querem", sem preconceitos.

1 comentário:

Noname disse...

Sim, tens razão, o feminimo cá é visto como um capricho de dondoca.
Eu tenho "O Segundo Sexo" em casa (se o quiseres ler em português). Li-o há muito tempo, só me lembro que gostei muito. Dos outros, não li nenhum, gostava de comprar o Persepolis!

Bj