quarta-feira, janeiro 23, 2008



A História de um Sonho - Arthur Schnitzler

Arthur Schnitzler é um escritor austríaco frequentemente comparado a Sigmund Freud, devido ao seu interesse pela psicologia/psiquiatria. O livro “História de Um Sonho” foi escrito em 1926 sendo conhecido como o livro que deu origem ao filme “Eyes Wide Shut” de Stanley Kubrick. Schnitzler escreve sobre um casal, Albertine e Fridolin, que numa troca de confidências prometem ser honestos e exporem-se relativamente aos seus desejos mais íntimos e sonhos mais secretos. Fridolin acaba por entender que afinal todos os desejos da mulher dos quais ele não faça parte não contribuem para a segurança do relacionamento, sentindo necessidade de dar azo ao seu direito de desejar outras mulheres. Fridolin acaba por ir parar a uma orgia sem ser convidado, orgia essa pertencente a uma organização secreta que não trata muito bem os intrusos (e quem não se lembra da festa do filme “Eyes Wide Shut” e daquelas notas de piano). A noite de Fridolin confunde-se com o sonho de Albertine pelo seu erotismo e “danos colaterais” na relação. O livro é muito interessante, e um pouco diferente do filme. Enquanto que o filme nos dá aquilo que o livro não nos pode dar de forma muito intensa, como a banda sonora, as cores, as pausas e os silêncios incomodativos, o livro oferece uma maior percepção da influência dos sonhos e desejos no relacionamento do casal.

quinta-feira, janeiro 10, 2008

A Vida e o Tempo de Michael K - J.M. COETZEE

Vencedor Booker Prize e Prix Étranger Femina

Este livro de J. M Coetzee não nos fala sobre uma história ou sobre um enredo, mas sobre a vida de uma personagem e da sua adaptação a um árido cenário. Michael K é um indivíduo que não está interessado nem compreende o que sucede à sua volta (guerra civil na África do Sul), querendo apenas viver a sua vida em paz e em liberdade. Michael K traçou objectivos simples para a sua vida e para as suas capacidades, como levar a mãe à terra natal e viver do que a terra lhe tem para oferecer. Não quer que cuidem dele apesar de ser doente e frágil, não quer trabalhar para um objectivo incompreensível nem interagir com as outras pessoas. Michael K dispensa a caridade e não quer contar a sua história, apenas quer existir à sua maneira. Ao longo do livro observamos Michael K e temos pena dele (exactamente o que a personagem nunca iria querer), pensamos que alguém o deveria ajudar, que alguém deveria reparar na sua incapacidade para estar num campo de trabalho e no facto de nunca vir a constituir uma ameaça numa guerra alheia. Pensamos que poderiam arranjar-lhe uma casa com uma horta e deixá-lo em paz. Continuamos a observar Michael e o definhamento do seu corpo pela fome e pela doença, mantendo-se sempre a obstinação de chegar a um determinado lugar sem se poder defender. Vemos Michael a ser roubado, enganado e acusado de algo que não fez. Vemos Michael a tentar escapar a todos os locais em que não pode exercer o seu direito de escolha. Quando a personagem é internada porque alguém finalmente repara no seu débil corpo e quando o tratamento e alimentação são disponibilizados, vemos Michael a recusar-se a ser ajudado e a fugir (na incredulidade do médico que o tenta compreender). Michael não é nenhuma personagem especial que mereça particular atenção, é apenas alguém que aspira a liberdade.
O livro é interessante pela ideia que deixa ao leitor e pela escrita de Coetzee, com a sua capacidade em descrever o óbvio da maneira mais simples.

“Eu sou mais parecido com uma minhoca, pensou. Que é também uma espécie de jardineiro. Ou uma toupeira, também um jardineiro, que não conta histórias, porque vive no silêncio. Mas quem encontra uma toupeira ou uma minhoca num chão de cimento?”.

quinta-feira, janeiro 03, 2008



A nova Byblos

No fim-de-semana passada tivemos a oportunidade de conhecer a nova Byblos, logo a seguir à visita habitual da FNAC da baixa. A Byblos não fica nas Amoreiras, fica na rua de trás (tem de se atravessar a estrada).
O que tem a Byblos afinal?
Ao entrarmos na Byblos deparamo-nos com uma interessante zona de revistas, um bom começo de 4000 metros quadrados dedicados à literatura. Ao percorrer os dois andares entendi que afinal o espaço não é assim tão grande como eu estava à espera, não sei porquê aconteceu-me idealizar um espaço muito maior. Nas paredes encontramos a frase "O paraíso poderá ser uma espécie de livraria." Ao fim do corredor encontramos uma zona para crianças com um barco. Aliás, toda a livraria é family-friendly. Há espaço suficiente para andar com carrinhos de bebé, há uma pequena sala onde alguém conta a história de "O Pedro e o Lobo" para um conjunto de crianças. Depois comecei a reparar nos aspectos menos agradáveis. Talvez seja por estar ainda no início, mas nota-se uma grande falta de títulos considerados básicos no mundo da literatura. Alguns autores estão muito bem representados, com todos os seus livros , enquanto que outros estão muito esquecidos. Mesmo alguns livros que neste momento são best-sellers estão em falta (o "Expiação" de Ian McEwan estava esgotado). Alguns livros não estão bem arrumados (o "Beatles" de Lars Saabye Christensen está na secção de música, e não é um livro sobre música), enquanto que outros parece que estão arrumados em todo lado (como o livro do Ricardo Araújo Pereira). Também havia qualquer coisa que me surpreendeu com o livro "As Horas" de Michael Cunningham, mas já não me lembro o que era. Gosto de mesas dedicadas a um autor com todos os seus livros, mas irrita-me o desperdício de uma mesa com imensos exemplares do mesmo livro (O Rio das Flores). Também fiquei triste ao verificar que na Byblos também se vendem CD's (em número ridículo, mais valia não terem nada), DVD's, jogos de computador... Se eu fosse um livro sentir-me-ia tremendamente ofendido. Também penso que os peluches são desnecessários, mas se calhar é apenas a minha opinião. Se calhar a maioria das pessoas gosta de ver outras coisas sem ser os livros, para que a saturação pela loja não ocorra tão depressa. Não vi ninguém a utilizar os computadores (sem ser por mera curiosidade), acho que não vão ser muito úteis. Penso que vai ser sempre mais fácil perguntar ao funcionário, que ainda por cima diz logo onde se encontra o livro (nem todas as mesas estão identificadas com códigos de localização e haja paciência para andar à procura). Penso que seria mais útil se nos computadores fosse possível consultar o "universo" à volta do livro (sobre o autor, críticas, etc).
Espero que a Byblos seja um sucesso (como espero para todas as livrarias), mas temo que quem realmente se interesse pelos livros continue pela FNAC (preços mais convidativos, maior diversidade, menos destaque aos best-sellers). Quem se interessa apenas medianamente pelos livros se calhar acabará por optar pelas livrarias dentro dos centros comerciais, pela maior diversidade de lojas.